quarta-feira, 26 de novembro de 2014

DESPEDIDA (TEMPO DE ESCOLA SALVADOR GORI)

Há três anos tive a oportunidade de retornar ao Tempo de Escola, e o fiz com uma postagem que ficou neste blog. Ela pode ser conferida clicando aqui. O texto era finalizado com um desejo: QUE SEJA LINDO!

Nem nos meus melhores sonhos eu imaginaria que seria LINDO COMO FOI. E a verdade é que estou até agora ainda tentando organizar os pensamentos e as ideias, o dia de hoje merece um texto à altura destes três anos. Tentarei então finalmente organizar o texto de forma mais poética a partir de agora.

Venho sendo apresentado, durante três anos, a uma nova qualidade de vida e de rotina: Enquanto alguns esperam as sextas e sábados, há outros dias que me encantam. Um desses dias é a quarta-feira. Meio da semana para alguns, para mim, "Quartas Fantásticas".  início de encontros potentes, de experiências estéticas, emotivas, dias de abraços, beijos na testa, de ouvir "eu te amo" com sinceridade assustadora, Para alguns, meio do caminho, para mim, começo, meio e fim. 

Foram dias e dias de suspirar sozinho ao dirigir meu carro, dia de emoções fortes, de carinho gratuito e verdadeiro, de ver gente se transformando verdadeiramente, de eu verdadeiramente me transformar. Vivi cenas dignas dos mais belos filmes, ouvi coisas que é difícil acreditar que saíram da boca de gente tão nova. Vivi tão intensamente estes três anos, foi uma troca tão intensa e eu amei tanto cada um. Alguns nomes passaram a ganhar significados mais fortes e valores afetivos nunca antes imaginados. Foram dias tão especiais, fantásticos.

Mas num desses temporais, numa dessas tempestades que chegam e varrem tudo o que foi construído, meu coração, um jardim florido, foi desflorado, a chuva deu no meio beleza construída, deixou a incerteza, o medo, a saudade mesmo antes de terminar.

E os abraços fortes de três anos, há três semanas estão sendo cada vez mais intensos. Após uma conversa sincera, uma dessas criaturinhas me diz: "Então é por isso que seu abraço está diferente. Você abraça a gente, respira fundo e quase não solta...". Vinha chegando a hora da despedida. De um até logo, talvez adeus, quem sabe.. E os abraços tinham quem ser mais aproveitados a partir de então. Sabe-se lá qual o que será do futuro.

Como educador, me vi na obrigação de ser honesto, de explicar o grau de incerteza que envolve o futuro, Afinal, é esta honestidade que sempre cobrei de cada um deles. Sempre acreditei que só posso cobrar o que eu mesmo faço. "Talvez seja o último ano. Não sei se estarei de volta e se estiver, não sei se com vocês, ninguém sabe...". E há três semanas já estamos nos despedindo. Tem sido uma transição dolorosa, mas madura e cheia de amor.

Acredito também na importância dos rituais, do abrir e do fechar de ciclo, da importância da alfabetização emocional. Alguns não gostam, preferem poupar as crianças de viver suas emoções. Escrevi um texto um dia dizendo que "a gente vive querendo poupar. E a fruta só vira poupa. Não cria casca...". É preciso também fazê-los entender que a vida é assim: Recomeço constante, e a despedida faz parte dela. Por quantas despedidas e transições eles não vão passar durante a vida? A escola em que eu acredito, também prepara para esses momentos. 

Muitos deles estão comigo durante todos os três anos. Uma fidelidade de dar inveja. Uma relação tão profunda e complexa que mesmo de longe um olhar e um gesto são capazes de comunicar um universo de discursos. E nestes três anos eles já são capazes de me conhecer o suficiente para saber que o último dia é sempre um dia especial. Já virou até piada do tipo "quarta que vem eu trago um balde de casa". Eles sabiam. Eu também sabia.

E embora soubesse, a gente se espanta com a força do momento. Ouvi coisas absurdas, as declarações de amor mais lindas, ditas com a voz embargada, abraços e soluços. "Você contou a história do seu professor Renato, VOCÊ É O MEU RENATO E EU NUNCA VOU TE ESQUECER PORQUE VOCÊ MUDOU MINHA VIDA". E quem me conhece, sabe a importância dele pra mim. É o meu herói, alguém de carne e osso que passou por minha vida e que até hoje, nos momentos mais difíceis, desce da nuvem onde mora e com sua história me ajuda a transformar um cenário ruim naquele jardim florido. O último dia, então, passa a ser uma celebração dos três anos que vivi ao lado daquelas pessoinhas. "EU ENTREI SÓ ESTE ANO, MAS POR CAUSA DESSE ANO EU SOU OUTRA PESSOA". O último dia passa a ser talvez o último dia.

Alguém fala do próximo ano e eu digo: "Caso alguém esteja no meu lugar, mostrem tudo o que aprenderam, porque eu não educo vocês para serem bons comigo, mas para serem bons lá fora. E jamais me comparem com quem estiver com vocês." E ouço uma resposta curta e significativa. " E dá pra comparar?". Lágrimas rolam. Meu Deus, o que é isso?

Finalmente as mãos que começaram marcando as minha camiseta na primeira aula do ano, escrevem nas luvas que representam as mãos que se transformaram, o que eles querem receber e o que querem dar para o resto da vida. A mão esquerda recebe, a direita dá. E como último exercício, as mãos desenham pelo espaço, mãos direitas encontram mãos esquerdas. Abraços, abraços, lágrimas, um pouco mais de conversa. O último beijo na testa, uma foto em grupo e uma foto com cada criança. Já é tradição. Cada um receberá a sua.

Acabou.

Foi assim que aconteceu. Foi assim que essas crianças entraram em minha vida e nunca mais saíram. Eu torço para que elas sigam curando o mundo, encontrando mãos que possam receber tudo o que elas têm para dar e que também elas possam encontrar o que precisam. Já tinha amado antes, mas a experiência que tive com essas turmas servem como a confirmação, o arremate final, o segredo da alquimia perfeita: um educador que ama e encontra olhares dispostos.

Agradeço imensamente a todos que estiveram comigo nesta jornada. À toda equipe, aos de hoje e de ontem, aos que acompanharam de perto e de longe, mas acima de tudo a cada criança com quem tive o privilégio de conviver durante este Tempo de Escola. Vocês mudaram minha vida, chegaram e tomaram meu coração de assalto. Eu amo vocês de uma forma tão intensa. Se algo próximo disso, for o sentimento de ser pai, não vejo a hora de ter filhos. Enquanto isso, peço licença aos pais de vocês para chamá-los de AMORES DA MINHA VIDA. OBRIGADO POR TEREM VIVIDO COMIGO ESSE TEMPO.

E hoje crio uma nova expressão para falar sobre o dia de hoje. Todas foram quartas fantásticas, mas esta será eternamente conhecida como a A QUARTA INESQUECÍVEL. \






2 comentários:

Anônimo disse...

Lindo! É triste saber que coisas incríveis se acabam ;; (((((( parabéns a todos que participaram disso , Varlei você é 10 ! Eu te amo muito ♡

Grace Luciana disse...

Varlei fico muito emocionada com o que li. Não é o fim é o começo para cada uma dessas crianças maravilhosas. Ter vc na vida delas irá mudar pra sempre cada uma das escolhas de vida delas. Quero muito que vc retorne, mas entenderei sua posição. O futuro a Deus pertence, mas peço a Ele que vc esteja lá. Minha total admiração e amizade a vc. Muito obrigada por existir.